Assalto

Pode levar tudo, moço, pode levar. Só não me machuca, por favor. Toma aqui o dinheiro, o celular e a carteira. Os cartões? As senhas estão nesse papelzinho aqui. Pega o relógio e a mochila também. Leva o carro, aqui as chaves. É o sedan preto parado na frente da farmácia, pode levar. Leva a chave da casa também, pode ficar com ela, com a tv, os móveis, o computador e os livros. Embaixo do colchão tem um dinheirinho guardado, pode pegar. Só não me machuca, por favor.

Toma meus sapatos, e as meias. As roupas também, pode levar. Aqui, essa correntinha. É de prata, herança do meu pai, mas pode levar. Só não me machuca, por favor. Pode ficar com meu emprego, leva minha mesa e meu horário de almoço. Meus rins? Aqui, pode levar. Os olhos e a vesícula biliar também. Leva minhas digitais. Leva os pulmões, os pelos encravados, leva o corpo, leva tudo. Só não me machuca, por favor.

Pode pegar meus sonhos também, as memórias de infância e os amores todos, pode pegar. Leva minha preguiça matinal, leva meu pico de café, leva tudo, pode levar. Leva minhas frustrações e meus medos irracionais, moço. Leva meus pesadelos. Leva minhas noites sem sono. Leva minhas esperanças. Leva minhas expectativas. Leva minhas preocupações. Leva minhas paranóias. Leva minhas certezas. Leva tudo, moço. Leva tudo.

Obrigado, já me sinto mais leve.

6 comentários sobre “Assalto

  1. Zulmira 29 de abril de 2016 / 01:52

    Era um assaltante ou era a Morte?! Só esta última para levar tudo mesmo, e deixar a pessoa assim, aliviada…

    Curtido por 2 pessoas

    • Ivan Cardoso 29 de abril de 2016 / 03:43

      Uma interpretação interessante, Zulmira. Quem sabe não era ela mesma?
      Obrigado pelo comentário, sempre.

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